quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Marias Capazes

Numa altura em que vejo pessoas bem de perto a serem descriminadas pelo sexo, estado civil ou vontade/estado de gravidez, penso que este mundo vive um ciclo de retrocesso. Ou que talvez os lemas apregoados de valorização da mulher e das suas conquistas espantosas das últimas décadas nunca tenham sido verdadeiramente engrenados na máquina que move o mundo. 
Somos mais mulheres que homens no curso, na especialidade, no hospital. Mas olhando para os lugares de chefia? Um administrador, um diretor, vários chefes de serviço (apenas uma mulher)... Na realidade podemos ser melhores, mais competentes, mas esforçadas, mas somos mulheres. E engravidamos. E temos filhos que adoecem e precisam de nós. E isso logicamente só nos faz mais capazes, rosas de aço, como hoje li a Rita Ferro Rodrigues chamar as suas (a visitar MARIA CAPAZ). Somos capazes de albergar uma vida que se gera, de educar e encarreirar uma vida que se cria, de comandar uma casa, dar amor ao marido e lidar com os vários problemas familiares com sensibilidade apurada, de um multitasking que é apenas utópico para os homens, de fazer construtos mentais que batem (confundem, diria até) qualquer argumento masculino... Mas no local de trabalho? Maioritariamente soldados rasos. Florzinhas a compor o jardim (sim ontem disseram-me isto) que é guardado por homens. E o pior é que olhamos umas para as outras como menos capazes. Aflige-me ver que as enfermeiras do meu serviço  escolhem preferencialmente um homem pediatra. De preferência com alguma idade e cabelo já a acinzentar. Acham que é claramente mais competente por isso. Ora o que está errado nisto? Tudo. A competência não é medida pelo sexo ou pela idade (ou pelo grau de importância dada à aparência física by the way). Temos que acreditar umas nas outras em vez de nos perdermos em vielas de escrutínio da vida alheia que só trazem ao de cima o pior que podemos ser. Temos que lutar contra a máquina que está toda construída para valorizar o homem, ensombrando as características que nos tornam líderes mais do que capazes. Tal como o #HeForShe, brilhantemente defendido pela Emma Watson nas Nações Unidas, tem de existir um #SheForShe. E temos de ter coragem de denunciar as múltiplas situações em que no ambiente de trabalho ser mulher impede tão simplesmente uma contratação, quanto mais uma progressão na carreira ou posição de liderança.

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