quarta-feira, 21 de dezembro de 2011


"O diploma que regula o pagamento das horas extraordinárias aos médicos é o Decreto-Lei 62/79, de 30 de Março, visto e aprovado em Conselho de Ministros de 10 de Janeiro de 1979 por Carlos Alberto da Mota Pinto, Manuel Jacinto Nunes e Acácio Pereira Magro e promulgado pelo Presidente da República António Ramalho Eanes.
Dizia-se logo no Art. 1º - “o regime de trabalho do pessoal hospitalar é o que vigora para a função pública, com as especificações estabelecidas no presente diploma.”
Era, portanto, aceite que o pessoal hospitalar tinha especificidades e que desse facto teria que resultar um processamento diferenciado de pagamento e de distribuição de horário, pois só um tolinho pensa que trabalhar de noite é o mesmo que trabalhar de dia, trabalhar 12 horas consecutivas (ou 36h...) é o mesmo que trabalhar 8 horas, trabalhar aos feriados, sábados e domingos, por períodos de 12 ou 24 horas, é o mesmo que trabalhar das 9 às 5 horas aos dias de semana. Acresce que até hoje não se soube premiar de outra forma a responsabilidade médica, intransmissível e especialmente em crise na Urgência.

Mas chegou a crise e a dependência financeira com imposição de regras pelos credores.

A Proposta de Lei Orçamento de Estado para 2012 veio revelar que a intenção do Ministro da Saúde e do Governo era mostrar-se dócil e bom aluno perante o credor, procedendo a um corte excepcionalmente duro para toda a Função Pública, mantendo, na maioria dos casos, a dízima mensal, confiscando subsídios de Natal e de Férias e, para os médicos, num ataque directo sem precedentes, impondo uma redução média de 50% no valor a pagar nas horas extra (quando eu, interna, ganho cerca de 4 euros por cada hora extra), ao mesmo tempo que cândida e hipocritamente, se deseja que os médicos se mantenham dóceis, ao dispor, pelo tempo que seja necessário (incluindo horas extraordinárias ilimitadas), ignorando o esforço e a responsabilidade associadas a este tipo de trabalho.

Os médicos estão há anos a sustentar o SNS com o seu esforço e dedicação, muitas vezes com desprezo pela sua saúde e pela sua família.
Mas toleram muito mal a desconsideração e o ataque directo, injusto e injustificado."
SIM


É preciso que se perceba que a ideia instituída de que o médico ganha muito bem já há muito tempo perdeu validade. Eu além das horas extra que tenho de fazer (e não que quero fazer para ganhar mais dinheiro, como muitos pensam) trabalho sempre, mas sempre, além da minha hora, sendo que se fizer as contas entre o que ganho e as horas que trabalho, ganho cerca de 5 euros por hora ou nem isso... É bom que esse velho argumento não seja usado para agora nos cortar no vencimento das horas extra e dizer que as podemos fazer de forma ilimitada. É que temos como trabalho vidas. Para os que estão a ler isto e a pensar "são funcionários públicos têm que sofrer como os outros" pensem se querem ver um familiar vosso ser atendido por um médico a trabalhar há 36h, ou mais, sem descanso. Para além disso acho fascinante que a crise seja paga pelos funcionários públicos quando todos contribuíram para ela.
Espero que a greve às horas extraordinárias seja uma realidade e espero que finalmente percebam o absurdo que é o senhor ministro dizer que somos 1000 a mais... Porque quando pararmos de fazer extras e de nos desdobrar em 2 ou 3 o SNS fecha portas. A cirurgia geral (onde colegas minhas têm como parte do horário normal períodos de 36h ou mais) será a primeira a ressentir-se, mas, passo por passo, acontecerá o mesmo com cada uma das outras especialidades.  

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